sexta-feira, 9 de março de 2018

Primitivas ruas do Recife


PRIMITIVAS RUAS DO RECIFE
Recife, março de 2018
Fotografia e texto de Leonardo Dantas Silva

 
Durante a Dominação Holandesa (1630-1654), as ruas do Recife eram conhecidas pelos nomes de Rua Real, do Vinho, do Mar, da Balsa, do Carcereiro, Nova, do Mercado Velho, do Dique de Orange, do Dique do Porto, do Bode, do Mouro, Terreiro dos Coqueiros, conforme demonstra José Antônio Gonsalves de Mello in Tempo dos Flamengos p. 74 e 111. Algumas identificáveis em nossos dias: Rua do Bode seria a Rua dos Judeus, onde se instalou a primeira sinagoga das Américas, em 1636, e hoje tem o nome de Bom Jesus; a Rua da Balsa, “a mais importante do Recife, toda pavimentada”, é hoje a Avenida Marquês de Olinda; a Rua do Vinho, “onde estavam localizados os mais vis bordéis do mundo”, é hoje trecho da Avenida Alfredo Lisboa; o Terreiro dos Coqueiros, onde estava instalado o Grande Mercado de Maurícia, passou a ser no século XVIII a Praça da Polé e, nos nossos dias é conhecida como Praça da Independência; também carinhosamente chamada de Pracinha do Diario.
Já no século XIX, escrevendo sobre o Bairro do Recife, Antônio Pedro de Figueiredo (1822-1859), que assinava no Diario de Pernambuco a secção “A Carteira”, sob o pseudônimo Abdalah-el-Kratif., na edição de 5 de outubro de 1857, relaciona:
Tem vinte e sete ruas: a da Cadeia, a da Cruz, a dos Tanoeiros, a do Trapiche, a do Vigário, a do Encantamento, a da Cacimba, a dos Burgos, a do Amorim, a do Cordoniz, a da Moeda, a da Lapa, a do Costa, a da Madre de Deus, a do Torres, a da Lingueta, a da Senzala Velha, a da Senzala Nova, a da Guia, a do Brum, a do Pilar, a dos Guararapes, a do Farol, a do Cais, a do Apollo e a do Areal.
Tem treze becos: o do Noronha, o do Abreu, o do Gonçalves, o do Campelo, o das Miudinhas, o do Porto, o de Manuel Antero, o do Valadares, o do Pascal, o do Teixeira, o do Largo, o do Tocolombó e o do Monteiro.
Contam-se sete travessas: a do Vigário, a da Madre de Deus, a das Crioulas, a da Guia, a do Vieira, a dos Guararapes e a do Farol; e quatro largos, o da Alfândega, o da Assembléia, o do Corpo Santo e o do Pilar.
As primitivas ruas do Recife, quando não serviam para indicar antigos edifícios ou prédios do uso comum da população, quase sempre tomavam o nome do seu primeiro morador, como se depreende de aquarela pintada pelos frades do Convento da Penha denunciando a construção da “ribeira nova”, mercado destinado à comercialização de frutas e verduras, no bairro de São José. O documento de fins do século XVIII, atualmente conservado no Arquivo Histórico Ultramarino (Lisboa), traz o traçado de algumas casas com alguns nomes de ruas: “as casas de José de Souza Rangel”; “a Rua da Praia chamada do Rangel”; “rua chamada também da Praia com o nome de Santa Rita Nova”; “rua encostada ao muro da Penha que vai para São José”; “largo chamado da Penha”.
A Rua do Crespo, cujo nome antecedeu a nossa atual Primeiro de Março, tem também sua identificação com Manuel de Souza Crespo, natural da cidade do Porto (Portugal), que veio para o Brasil como marinheiro em 1648 e aqui se transformou em mercador, residindo na Cidade Maurícia, em rua que lhe tomou o nome, permanecendo até fins do século passado.
A Rua do Espinheiro fora antes, como se depreende da edição do Diario de Pernambuco de 4 de setembro de 1828, o Sítio do Espinheiro que deu origem ao Beco do Espinheiro. Nas suas cercanias o cidadão Pedro da Hora Santiago anunciava pelo mesmo jornal, na edição de 2 de fevereiro de 1874, a venda de uma casa “não acabada em terreno com 50 palmos de frente e 500 de fundos nas proximidades do Beco do Espinheiro”. O mesmo Pedro da Hora Santiago, na edição de 19 de junho do mesmo jornal, que trata da sessão da Câmara Municipal de 20 de abril do mesmo ano, tem publicada uma petição “pedindo licença para rebocar sua casa na Rua da Hora, no Beco do Espinheiro”.
O antigo Beco do Padre Inglês, hoje rua, remonta ao ano de 1837 quando ali foi morar o reverendo Charles Adye Austin, primeiro capelão da igreja anglicana da Santíssima Trindade, construída pela comunidade inglesa na Rua da Aurora, que aqui chegou em 28 de abril de 1835.
No bairro de São José, a Rua da Concórdia, que certa vez tentaram mudar o seu nome para Marquês do Herval, teve a sua denominação originada de uma disputa dos seus antigos moradores, Manuel José e José Fernandes. Em 1833, porém, foi proposta a denominação de Rua da Concórdia, sugerida pelo vereador Antônio Peregrino Maciel Monteiro, depois Barão de Itamaracá, homologada, em 5 de novembro daquele ano pela Câmara do Recife, que pôs um fim à celeuma.
A Rua das Trincheiras, desaparecida com o alargamento da Avenida Dantas Barreto, já era conhecida com esta denominação em 1654 quando do Inventário de Armas e Petrechos Bélicos etc. A decantada Rua da Aurora surgiu de um aforamento concedido pela Câmara, em 20 de dezembro de 1806, a Cassimiro Antônio de Medeiros para aterrar o trecho do rio e nele construir as primeiras casas. Inicialmente, tomou o nome do seu primeiro morador, mas logo adotou a sua denominação atual, por se encontrar localizada de frente para o nascente, ao contrário de sua paralela, a Rua do Sol, que se encontra voltada para o poente.
Como na canção de Alceu Valença e Vicente Barreto:

Pelas ruas que andei... procurei.
Procurei... , procurei.., te encontrar.
Na Madalena revi teu nome

Na Boa Vista quis te encontrar
Rua do Sol,  da Boa Hora
Rua da Aurora, vou caminhar
Rua das Ninfas, Matriz, Saudade

Da Soledade de quem passou
Rua Benfica, Boa Viagem
Na Piedade tanta dor...

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